Interior of the Colosseum of Rome, 1832, Cole Thomas.

A queda do Governo e o Império Romano

1.

Quando o Criador, na sua infinita sabedoria, inspirou ao apóstolo a visão tenebrosa do Apocalipse, nunca imaginou vir a ser superado pelos comentadores políticos portugueses na noite do dia 8 de novembro de 2023. Com efeito, os quatro cavaleiros saídos da abertura do primeiro selo do rolo manuscrito na mão de Deus não souberam interpretar devidamente a ira divina, pelo menos quando comparados com a fúria vingadora das redações jornalísticas ultrajadas. Nessa tenebrosa noite, na quadrangulação simétrica do ecrã, as dez mil cabeças falantes, emblema da universalidade, lançaram sobre o país não apenas guerra, morte, doença ou fome, mas os efeitos tenebrosos do recebimento indevido de vantagem. 

Lamentavelmente, ninguém se lembrou de invocar Nixon, que, quando concorrendo à vice-presidência em 1952, declarou ter aceitado um presente, um cão chamado Checkers, para logo solenemente, num dos discursos de campanha, manifestar em público não ter qualquer intenção de o devolver. Contudo, a noite do dia 8 de novembro de 2023 não convidava à erudição e muito menos ao humor – dada a necessária e escrupulosa separação entre conteúdos na grelha de programação das televisões. Na verdade, uma das mais famosas jornalistas portuguesas (após uma década de esforços dedicados à salvação nacional) falou mesmo na «grande bomba» caída sobre «o primeiro-ministro». Ficou a saber-se: António Costa fora alvo de mais de 20 interseções, em escutas, todas validadas «não por um mas por dois juízes do Supremo Tribunal de Justiça». E logo se concluiu, ao som das trombetas de bronze: «é difícil que as escutas não tenham relevância penal». Escândalo. Dos olhos gelados da famosa jornalista, fitando medusinos os telespetadores, saiu tremendo o juízo: «É bom que as pessoas entendam que o peão, o elo de ligação é João Galamba». Como as grandes profecias dos Deuses em Concílio, também os comentadores reunidos tinham já vaticinado que o ministro das Infraestruturas teria de cair, de tal forma eram evidentes os indícios de crime no seu brinco, no corte de cabelo e até na colocação nasal da sua voz mefistofélica. Soubemos depois que o ministro das Infraestruturas fora escutado durante quatro anos, traduzindo-se a investigação em mais de 82 mil escutas. «Muita escuta, pouca uva» – afirmou mais tarde um dos canais de televisão – pois «menos de dez foram indiciadas como prova». Supomos que os empresários envolvidos no processo tenham sido escutados desde que saíram dos portões infectos das faculdades de engenharia e gestão ou mesmo ainda no berço, não fosse o Diabo tecê-las. O país estava em estado de choque e várias estátuas erguidas aos sonhos do 25 de Abril choraram sangue.

Alegadamente, membros do governo tinham reunido com empresários no sentido de agilizar projetos de investimento internacional. Horror, tragédia, catástrofe. A situação corria descontrolada nas redes sociais, onde grupos de matronas se imolavam pelo fogo e idosos veteranos em lares da periferia prometiam justiça com as suas próprias mãos. Ninguém adivinhava nessa altura que tudo podia ainda piorar, quando o primeiro-ministro, já demitido, tentou explicar em direto na televisão (usurpando o espaço da justiça aos magotes) como a atividade política implica objetivos nem sempre facilmente compatíveis com as rotinas administrativas. Duplo escândalo. A estátua da República cobriu de vergonha o seu peito desnudo. Onde já se viram ministros em contacto com representantes de empresas? Não é tarefa dos ministros despacharem os assuntos em gabinetes, vestidos de burca, para não manterem contacto visual com as forças nefastas das redes internacionais de negócio, cujo famoso amuleto é uma orelha cortada a uma velhinha esfomeada?

A essa hora, os carros de reportagem estacionavam em frente à residência do ministro das Infraestruturas, na esperança de surpreender o titular da pasta em fuga com um saco de notas às costas, uma vez que o próprio chefe de gabinete do primeiro-ministro guardava entre as páginas dos livros uma pequena fortuna. Por muito que tentem, não podem escamotear este facto. Porém, de certa forma, é compreensível. O interior de um livro num gabinete ministerial deve ser um dos lugares menos frequentados do mundo. Sabendo o professor e economista como o dinheiro costuma desaparecer dos cofres da Banca, julgou mais seguro guardar ali as suas poupanças. Quem o pode censurar?  Nem o covil do leão beneficia de uma vida mais sossegada. Contudo, faltavam elos de ligação nesta cadeia de factos inusitados. As evidências resistiam à causalidade.

 

2.

O silêncio das penas eternas abateu-se então sobre as cabeças falantes. Os flashes dos fotojornalistas, os perfis dos arguidos manietados entre guardas, em janelas de primeiro andar, ao estilo dos quadros renascentistas das tragédias florentinas, conferiam ao ecrã a solenidade necessária aos grandes atos de justiça. A democracia portuguesa estava finalmente confrontada com o seu monstro: a corrupção ministerial em jantaradas de tostas de abacate acompanhadas com kombucha. Segundo a voz corrente dos jornais e das televisões, alegadamente, o primeiro-ministro poderia (e todos sublinhavam este “poderia”) ter vendido por soma desconhecida ou oferta misteriosa (quem sabe algum bilhete Vizela-Benfica, mas com direito às carnes frias) o acesso ao sanctum sanctorum do seu gabinete – na expressão de jornalistas eminentes. Mas não só. Recusando-se a falar ao telefone, apesar da vintena de interseções ao próprio e das várias dezenas de milhares de escutas a membros do governo, o primeiro-ministro oferecia a sua própria cabeça numa bandeja de prata. Pior do que a prova material só mesmo a ausência de provas, como sabemos, a mais cabal demonstração de que o arguido esconde alguma coisa. Se não cometeu o crime por telefone então está demonstrado que o cometeu de qualquer outra forma.

Como as noites televisivas vivem de uma certa temperatura, a famosa jornalista, em voz robotizada de máquina sem pruridos emocionais ou contemporizações fraternas (com ar de quem está pronta a enterrar o punhal no peito se assim o exigir a República) passou a confessar, comovida, mas sem ponta de orgulho: «A reportagem que eu fiz na altura está quase copy paste neste inquérito e o que eu dizia à época é que o ministro tinha interferido para afastar o empresário que trouxe o projeto para Portugal, favorecendo o consórcio liderado por grandes empresas. Mas esse consórcio dissolveu-se porque o ministro do Ambiente percebeu que se consumasse o negócio era crime». O luto instalou-se definitivamente nesse momento no desolado estúdio, quando as cabeças falantes relembraram o triste dia em que um ministro, ponderando a ilegalidade dos seus atos administrativos antes de os cometer, impediu um crime de corrupção e centenas de horas de comentário apaixonado, em que dezenas de jornalistas, advogados e comentadores tentariam descortinar os efeitos nefandos do nefando crime. 

Todavia, não era o momento de baixar a cabeça, mas de combater os prevaricadores. Será sempre intolerável a presença de cidadãos apostados em desvalorizar o crime de corrupção – supremo pecado dos povos do Sul – a verdadeira causa de toda a genealogia de pobreza e miséria tão característica das paragens onde, como dizia Goethe, crescem as laranjas de ouro. É do domínio público, os nórdicos não conhecem o crime de corrupção e os alemães tremem que nem varas verdes ao simples pronunciar da expressão, para não falar da América, terra dos livres, onde nunca a corrupção foi tolerada, nem que seja necessário eliminar a tiros de espingarda metralhadora crianças em idade escolar. Por outro lado, toda a gente sabe – e isto foi afirmado por pessoas dotadas de um cérebro e sistema nervoso central –, embora a corrupção seja larvar e explicativa do nosso «atraso» (na expressão do coelhinho da Alice no País das Maravilhas), «a cunha é odiada em Portugal». Os portugueses, é sabido, odeiam o favorzinho, a cunha, um jeito, o toque. Na verdade, foram os empresários (vindos de Marte) a espalhar essa perigosa epidemia social. Por exemplo, os donos dos jornais e das televisões, quando convidam diretores, abrem concursos internacionais para avaliar o mérito, o que explica o facto de a BBC e o The New York Times terem falhado a contratação do arquiteto José António Saraiva, perdendo a corrida para o Expresso, onde o vulto da informação e do romance foi diretor durante quase vinte anos. Do mesmo modo, as Universidades portuguesas (bastião inexpugnável e espartano na avaliação imparcial de competências) são outro exemplo de constante probidade, onde nunca a cunha, o favorecimento, o amiguismo ou o tráfico de influências alguma vez penetraram.

Como a situação parecia assim resvalar inaceitavelmente para um ambiente de ambiguidade e derrotismo melancólico, um não menos famoso jornalista (incansável martelo da justiça) logo explicou como parecia evidente que este governo – gangrenado pela moscambilha – estava condenado por evidentes sintomas de corrupção. Não fossem os tristes avençados a defender o socialismo e os empresários e o governo já estaria todo a ferros nos calabouços da Polícia em Moscavide – pois só uma fortuna nas Ilhas Seicheles justifica que alguém possa apoiar um primeiro-ministro eleito democraticamente com maioria absoluta. Na verdade, só uma grande falta de vergonha na cara pode levar alguém a lembrar que os cidadãos, mesmo quando representam grandes empresas, são pessoas com família, têm direitos e são inocentes até prova em contrário. Conhecemos bem esta estratégia insidiosa: lembrar direitos constitucionais e regras processuais. Vergonha. Os pequenos vilões do teclado gostam de proteger ministros e grandes empresários – piscando das suas caves húmidas o olho ao grande capital – a troco de pão para a boca, enquanto afundam na miséria os pobres cidadãos, que saídos da cama ainda de madrugada vão labutar diariamente nesta selva de políticos corruptos. Na verdade, toda a gente sabe que quando se escutam ministros durante quatro anos e se metem na choldra à bruta empresários e engenheiros com cargos em empresas, os pobres passam a ser automaticamente tratados como príncipes pelos magistrados e pelas polícias. 

Fica por esclarecer uma dúvida, mas sem importância: os pobres cidadãos (sempre invocados nestes momentos de salvação da pátria) não costumam ser chamados a dizer o que pensam sobre o facto de os governos, a braços com problemas de financiamento no SNS ou na Escola Pública, terem decidido durante a Pandemia oferecer respeitosa e diretamente 11,2 milhões de euros às trombetas da justiça – a saber, os órgãos de comunicação social – já por si alavancados em respeitáveis e legalíssimas dívidas (145 milhões de euros num dos casos, no último relatório público), dívidas sempre alimentadas pelos mesmos bancos onde se cobram juros de empréstimos para habitação a preços de fatias do próprio fígado dos cidadãos. Contudo, os cidadãos mais distraídos devem ser relembrados: esses empréstimos bancários a órgãos de comunicação social estão devidamente fundamentados nos ativos das respetivas empresas. Ativos cuja qualidade e consistência são inquestionáveis, pois dependem de audiências e vendas de publicidade, asseguradas por antigos políticos ou humoristas muito preocupados com a corrupção, e pagos por todo este bem dançado fandango de interesses, absolutamente transparente à luz da lei.

 

3.

Um advogado ilustre, chamado a relembrar os fastidiosos e irritantes princípios do Direito, mostrou-se perplexo e pouco informado sobre pormenores do processo no qual foi envolvido o primeiro-ministro, lembrando que por vezes, o que consta da indiciação no dia do interrogatório pouco tem a ver com os crimes que constam, anos depois, no despacho de acusação. Mas o famoso jornalista (incansável martelo da justiça) como se sentisse salpicos de lama casuística sobre a alvura do seu manto, logo afirmou: mas isso é a «dinâmica da investigação criminal». O advogado explicou então – um pouco fastidiosamente – que a «dinâmica da investigação criminal», por muito justa e necessária à saúde da República, não pode ferir os direitos dos cidadãos, mesmo que sejam ricos, engenheiros, cristãos, sócios do Benfica, ou conspurcados por outra qualquer mancha pecaminosa, sob pena de implosão de todo o sistema. O jornalista não permitiu tal lesão do dever de julgamento dos prevaricadores: «os senhores advogados preocupam-se mais com as fontes de informação dos jornalistas do que com os factos».

Na verdade, o senhor advogado teve dificuldade em explanar a sua pedagogia, pois a noite do dia 8 de novembro de 2023 não estava votada a detalhes técnicos. Por essa altura, um célebre consultor político lembrou ironicamente: «bem, não querer falar ao telefone só pode ser a prova de que se estão a cometer ilegalidades». Mas nem todos concordaram com a ironia. Como a situação parecia escorregar sem remissão para a atmosfera entediante de um julgamento, mas agora com escrutínio de argumentos, análise de provas e discussão escrupulosa de indícios, logo uma famosa comentadora de um jornal de direita, no estilo lacunar, mas delirante, que lhe é conhecido (qual enviada do planeta de Arrakis) causou grande consternação, embora devolvendo alguma alegria a quem monitorizava as audiências. Lembrou a enviada do planeta Arrakis como o primeiro-ministro demissionário beneficiava de uma duvidosa fama junto dos empresários: «não anda, não faz, não mexe». Isto, segundo a mesma comentadora, ao contrário de um jovem político (entretanto eleito líder do principal partido do governo demitido), com fama de fazedor: «pode fazer mal, mas faz». Ninguém soube muito bem o que fazer com este comentário e a emissão seguiu em direto para o Campus da Justiça, pois em boa hora um dos advogados dos arguidos, saindo para o frio da noite, lembrava aos jornalistas que falar sobre o processo na praça pública seria uma subversão das regras, um desrespeito pelo tribunal, o que motivou gargalhadas sonoras nos estúdios de televisão. Um outro advogado teve o desplante de afirmar: «a situação é grave. Trata-se de uma qualificação errada de processos político-administrativos normais». Esperava ainda o causídico que no final de tudo aquilo, ou seja, o processo, «o Ministério Público ainda estivesse de pé». Os advogados mais veteranos são de facto divertidos e parecem familiarizados com os prazos da justiça, pois é muito provável que, antes da conclusão destes processos judiciais, o problema não seja tanto a pertinência da investigação ou a matéria provada, mas quantos advogados teremos de exterminar a fim de garantir que a água potável chega para todos no planeta Terra.



4.

Em todo o caso, a violência das acusações do experiente advogado causou ondas de choque na cavalaria apocalíptica. Logo foi chamada de urgência, na sua vitoriana casa, a editora de política de um jornal de referência, cujo principal mérito é ser editora de política de um jornal de referência. Apesar da situação delicada em que se encontrava, logo recorreu à arqueologia das moscambilhas: «o advogado em causa, note-se, foi advogado do primeiro-ministro» disse com ar deliciado de quem retira do forno um tabuleiro de morcelas assadas. Grave. Recorrendo à velha máxima de Heródoto (é mais fácil enganar trinta mil pessoas do que uma só pessoa), e sabendo que a sua versão da moscambilha generalizada teria o eco da televisão, a editora de política de um jornal de referência partia (e bem) do princípio de que o facto de ser a editora de política de um jornal de referência, propriedade do fundador do principal partido da oposição, não teria a mesma importância de o advogado ser também um antigo advogado do primeiro-ministro. Uma coisa é uma coisa e outra coisa é outra coisa.

Já depois da meia-noite, quando os fogos tendiam a apagar-se com o frio da madrugada e os advogados cansados regressavam a casa nos seus carros de luxo, apareceu uma derradeira comentadora/jornalista da área política da oposição. Com ar de quem acaba de despachar a tiro de caçadeira uma companhia de zombies da corrupção, o olho ainda a tremer, lembrou que apesar de o primeiro-ministro poder não ter nenhuma responsabilidade criminal – «admito que possa não ter» – isso não o ilibava «de ter trazido consigo para o governo toda a tralha socrática». O conceito de tralha tem feito escola no jornalismo de investigação e a própria jurisprudência remete para esse fascinante conceito (“tralha”) despachando assim (sem necessidade de provas ou investigações competentes) muitos dos problemas probatórios clássicos em matéria de corrupção. 

É claro que as televisões exploram comercialmente toda a tralha política (incluindo a socrática) e quanto mais tralha, melhor. Acontece até que alguns canais de informação envolvem em suspeitas apresentadas em longas reportagens, a propósito de moscambilhas com bancos líbios, os comentadores de outros canais de informação, também alvos de teorias da suspeita muito elaboradas, mas por insondáveis mistérios sempre a salvo do martelo da justiça. Tudo vai bem, desde que a tralha não seja socrática. Sempre fornecem material para os humoristas depois capitalizarem a preceito com banhos de moralização refrescantes e divertidos. Humoristas cujas poupanças auferidas em grupos de Media podem por vezes desaparecer em moscambilhas promovidas em atos de gestão por antigos amigos dos donos desses grupos de Media. A justiça, caros leitores, é cega, mas gosta muito de poesia.

 

5.

A situação não acalmou, sobretudo depois de o primeiro-ministro, dias mais tarde, ter procurado explicar a sua posição sobre as esferas de influência do poder político (executivo) e do poder judicial, usando para isso as suas cordas vocais (supremo crime contra a reserva e decoro devidos ao primeiro-ministro, cuja expressão das ideias se deve processar por sinais de fumo, e não em S. Bento, mas no cimo de uma colina deserta). Mal terminou a sessão de esclarecimento nesse dia, logo se destacou nas televisões um jovem prodígio do comentário político. É difícil descrever esta deslumbrante personalidade, descrita por si próprio como oriundo da área do «conservadorismo liberal», um belo enxerto do castelo de Windsor em Santa Comba Dão, mas com o cravo ao peito, mistura de Edmund Burke e Marques Mendes. Podemos dizer que se alguma vez se concretizasse um programa Colégio de Eton/Portugal-Feira de Carcavelos, o resultado mais lógico seria o distinto comentador e jovem prodígio. Sempre à beira de um ataque nervoso, com o ar lívido do vampiro engravatado em folhos, o jovem prodígio fitou o pivot em estúdio como se este tivesse um colar de alhos à volta do pescoço, e pediu cabeças, relembrando a dignidade dos cargos, a dignidade dos espaços institucionais, a dignidade das instituições do espaço democrático, a dignidade da República, a dignidade dos processos de concorrência, a dignidade de o jovem prodígio estar a falar numa televisão sem que se lhe conheça um feito digno de monta a não ser o facto indesmentível de ser um jovem prodígio convidado para falar sobre a dignidade de tudo o que possa não ter dignidade aos olhos do jovem prodígio. 

Talvez não tenhamos estado à altura da comoção daqueles dias. No final deste grande desastre civilizacional, o vice-presidente e antigo presidente de associações de luta do bem contra o mal, ao jeito de quem passeia em casa de toga romana e se alimenta apenas de gafanhotos, veio a público lembrar, com os dentes ainda a ranger: «muita água ainda vai passar debaixo da ponte». Contudo, nem sempre lembra aos comentadores e muito menos aos comentadores-académicos que – além da água que possa ainda estar destinada a passar – muito mais água passou já, ao longo de séculos, debaixo dessa mesmíssima ponte.

 

6.

Se há livros a quem os venerandos historiadores atribuem a causa de violentas guerras – caso da Germania de Tácito – ninguém estava preparado para livros recheados de notas de cem euros impondo quedas de governo. Bem, as guerras podem ter muitas causas, mas o que tornava os historiadores imbatíveis era a atribuição da guerra a causas palermas. Temos finalmente o triunfo de causas palermas na origem da queda de governos. Quanto às notas de cem euros, fica por esclarecer a sua origem, mas aposto que não é pelo facto de aparecerem nesse lugar impróprio (as folhas de um livro num gabinete do chefe de gabinete do primeiro-ministro) que a sua proveniência venha a revelar-se muito mais inusitada do que por exemplo as voltas e reviravoltas na venda de pavilhões de espetáculos

Apesar de a montanha ter parido um rato, toda a República se congratulou por este momento ímpar. Afinal de contas, não é todos os dias que o humilde homem do café ou o condutor do táxi se sentem representados na vasta maioria dos espaços de opinião publicada. O leitor mais sensível aos defeitos do pedantismo logo se escandaliza. Mas não tem o taxista o direito de ver a sua inteligência reconhecida nos fóruns de opinião das elites lisboetas? Por certo, a democracia também se faz desta antiga prática, digamos, a demagogia. Muitos explicaram a guerra do Peloponeso com a frivolidade dos políticos. Péricles teria dado ouvidos aos conselhos do jovem Alcibíades, fazendo a guerra para desviar a atenção da sua própria má gestão dos fundos públicos. 

Seguindo a última moda universitária, talvez possamos atirar para o colonialismo perpetrado pelos romanos as nossas responsabilidades. Nunca se preocuparam com os nativos da Espanha ou da Gália. Desprezavam a língua e a cultura dessas paragens. Eram comuns os incentivos à pilhagem e ao massacre por prazer – segundo conta um espantoso professor, Arnaldo Momigliano. No entanto, havia também o perigo de desmoralização do regime imperial, altura em que Roma mandou instalar tribunais para julgar o mau uso de dinheiros públicos, em 149 a.C., em face do preocupante comportamento dos generais romanos na Península Ibérica. Com efeito, Políbio não se preocupou com estes assuntos, para quem os problemas morais causados pela destruição de Cartago eram tão pouco importantes como os problemas causados pelo seu amigo Cipião, ao destruir as cidades da Hispânia.

De resto, as fronteiras do Império Romano padeceram sempre de problemas, digamos, estruturais. Um bispo cristão Sinésio de Cirene, cavalheiro-proprietário, cresceu entre diálogos platónicos e as especulações de Aristóteles acerca da natureza. Habituado aos livros e à caça, e aos corruptos funcionários do império romano em queda, quando surgiu a oportunidade recorreu a expedientes pragmáticos. Na época, a situação não era fácil. Constantino ainda quis estabilizar a moeda, introduzindo uma medida de ouro, mas a desmoralização das classes médias e a queda dos salários dos funcionários imperiais e soldados conduziu ao desporto preferido dos romanos no fim do império: os subornos. Atividades simples eram carregadas com impostos, enquanto a esmagadora maioria das fortunas se destinava a ser destruída pela guerra. Por essa época, os cristãos cruzavam as fronteiras para norte, entrando no mundo pagão, onde, viajando com o comércio, compravam escravizados cristãos, mas também peixes, peles, mel nas feiras de Hamburgo, subornando os chefes locais. 

Quando uma guerra é perdida, um sistema político derrubado ou um império destruído e disperso, é certo que haverá uma investigação post mortem, e a discussão raramente acaba com a morte dos sobreviventes. Como sabemos, «o conflito é o pai de todas as coisas, a disputa e a discórdia são a alma da história». «A mais famosa das argumentações necrológicas», todos sabemos, incide sobre a queda do Império Romano no Ocidente. Outra é a queda da República Romana – lembrava o erudito Ronaldo Syme. Sob as lutas políticas da última fase «do Estado Livre em Roma, com a história de guerras e batalhas, pode-se discernir, como um processo constante, a emergência de um governo centralizado». Muitos séculos passaram e o Império Romano já pouco interessa, a não ser a raríssimos e obscuros académicos e a uns quantos praticantes de humor progressista. Mas os sinais do presente não parecem auspiciosos. Haverá futuro democrático para governos centralizados? 

 

7.

Não há artista de variedades premiado em canais de televisão que não se sinta hoje impelido a criticar a democracia liberal e o «capitalismo». Quando a Igreja se espatifa com estrondo – do alto do seu tenebroso domínio milenar – talvez ninguém suspeitasse a força com que o profetismo e a sermonária renasceriam pela mão de poetas, cantores, sátiros e outros moralistas, outrora enviados de Dionísio para confundir as certezas morais e o verniz reverencial dos costumes da cidade, e hoje reverentes sacerdotes, recorrendo a formatos consagrados (o talk-show, a canção ou a crónica matinal) para devolver o mundo aos eixos regulares dos bons princípios.

O que terá acontecido? Na verdade, nada. Apenas a olímpica ignorância do passado confere ao nosso tempo um ar de refrescante novidade. Por isso é tão urgente liquidar o passado (na escola, na política, na literatura). Em grande medida, o sonho iluminista do progresso foi tão espantoso no seu alcance (e ainda bem) que acabou por forjar um desprezo pela História. Já pouca gente resta – nas sociedades ocidentais – para lamentar o que o professor Arnaldo Momigliano (com a experiência de que o “progresso” pode significar grupos de malucos apostados em exterminar cientificamente outros grupos de pessoas) considerava uma característica da História: «ao longo do caminho muita habilidade científica, já adquirida, acaba sempre novamente perdida durante séculos». Na verdade – dizia Momigliano – «como o progresso da humanidade depende do esforço para não esquecer o que já foi aprendido, qualquer perda, mesmo que temporária, é lamentável». Não se veja nestas minhas palavras uma apologia ou idealização do passado. Pelo contrário. É imperioso sublinhar as espantosas virtualidades do presente, tão bem exemplificadas pela rede social X onde é fácil encontrar pessoas convencidas de que um antigo jogador do Sporting e do Estoril (entretanto a encaixar milhões nas Arábias) é a maior autoridade viva na teoria marxista da mais-valia. Quero apenas dizer que a função sacerdotal, a jeremiada, a diatribe tribunícia, a catilinária – tudo fenómenos reportáveis a séculos ou décadas antes de Cristo nascer – são das mais antigas muletas da ambição pública. Claro que pressupõem um discurso crítico capaz de galvanizar as multidões, mas sem beliscar demasiado quem tem o poder de ferir. Isto implica conhecimentos sofisticados de propaganda. Vejam-se as sábias mensagens públicas nas contas das redes sociais da jornalista salvadora da pátria, onde se acumulam centenas de comentários de cidadãos (força, maravilhosa, vai, dá-lhes) de fazer inveja a qualquer condottiero renascentista. Talvez o mais natural fosse convencer a jornalista a tomar o próximo passo e avançar para eleições. Suspeito que não estará para isso. Paga menos, dá mais trabalho, é mesmo imperioso dominar alguns temas e nunca se sabe o dia de amanhã.

 

8.

O jornalismo, atacado pelos novos conteúdos digitais, é talvez a vítima mais trágica do turbilhão democrático e da onda de conforto que se estendeu sobre o Ocidente nos últimos setenta anos. A nobre missão de escrutinar governos tirânicos (governos historicamente dotados com a capacidade para prender e perseguir cidadãos incómodos) tornou-se na caça ao escândalo judicial em Democracias cujos governos são altamente escrutinados e atacados em todas as frentes, mesmo quando beneficiam de maiorias eleitorais e mesmo quando não estão em causa crimes ou sequer atos censuráveis moralmente. É verdade, os governos têm poderes de coerção fiscal, movimentam orçamentos colossais na propaganda e beneficiam do apoio da máquina do Estado (embora se possam colocar sérias dúvidas sobre quem manda realmente). Também é verdade que os ministros (mas não todos) saltam depois para empresas, auferindo bons salários (mas não tão bons quanto os auferidos por alguns futebolistas, gestores, humoristas e diretores de programação das televisões), mas correm o risco de ser alvo de escutas durante anos e nunca se sabe se não vão passar a noite nos calabouços da polícia. Com culpa ou não, isso seria matéria para os tribunais e os processos judiciais avaliarem, um trabalho exigente, devido às dificuldades técnicas de interpretação da prova e da própria lei, em processos jurídicos cuja aferição da legalidade pode depender de conhecimentos de matemática avançada ou do estudo aprofundado do habitat da lagartixa. Mas já ninguém parece acreditar que a ciência – ou sequer o rigor – pode ser relevante no debate público. A convicção, a coragem, a estridência (com a necessária banda sonora orquestral e épica, bem como a realização cinematográfica da reportagem, com planos dramáticos de edifícios públicos e paisagens bucólicas de natureza selvagem) são os elementos do «jornalismo de investigação». Que é a verdade, senão o aplauso da multidão? A partir do momento em que a maximização da quantidade se estabeleceu como medida única e total da qualidade, o destino estava traçado. 

A própria ideia de um casamento estrutural entre ciência experimental e democracia – tão cara aos antigos e ainda acarinhada por professores de cultura clássica – foi definitivamente para as urtigas com a última epidemia. Longe vão os tempos em que atomistas – ou mesmo Hipócrates – defendiam teorias experimentais (ou pelo menos o enorme valor da observação e da prova no debate público) e por isso estavam atomistas e Hipócrates, próximos do entusiasmo democrático. Mas Platão e outros escritores do que supostamente foi “o Clube do Livro da Direita Grega” (mais outra espantosa expressão de Arnaldo Momigliano) trabalharam com entusiasmo e aplicação para sufocar a relação entre ciência e cultura popular. Como sabemos, pelo menos durante vários séculos, alcançaram amplamente os seus objetivos. Isto apesar da oposição de figuras como Epicuro e Lucrécio, pessoas que sendo atomistas eram evidentemente democratas, talvez os últimos «escritores de esquerda do Mundo Antigo» para citar outra vez o provocador Momigliano. 

As coisas nunca são tão simples como julgamos, se nos assiste a boa vontade de lançar luz sobre problemas difíceis, uma atividade normalmente mal remunerada. Galileu e Kepler (que não podem ser acusados de pouco interesse pela ciência antiga) consideravam-se platónicos e muita tinta tem corrido para saber se o castigo e a mordaça aplicados a Galileu não foram, no fundo, uma profilaxia pedagógica numa época em que dar demasiada informação a um público crente em bruxas e diabinhos de cabeça escamada poderia ser contraproducente, isto segundo a opinião dos guardiães da moral pública. Questão esfíngica, voltam a dizer-nos os académicos juristas: é preciso controlar a informação. Curiosamente, isto é dito pelas mesmas pessoas que identificam corrupção em todo o lado e parecem confiar mais no sistema judicial do que na discussão política para dirimir normais (e legais) conflitos de interesse. O problema é quando a fronteira da legalidade começa a oscilar. Ou pior, quando a fronteira da legalidade começa a ser usada como arma política. Uma tendência que os juristas académicos consideram ser a marca dos cascos da besta e o soar das trombetas da catástrofe, mas que os historiadores sabem ser a tendência normal de todos os sistemas democráticos, no momento em que as técnicas (legítimas) de manipulação da multidão deixam se surtir efeito, por corrupção dos canais de informação. De que forma evitar este desfecho? Se fosse académico, comentador ou jurista teria agora uma solução milagrosa, uma banalidade qualquer com dois mil anos, mas pincelada com o verniz da modernidade. Lamento informar: nada protege os cidadãos dos seus próprios ódios ou manias e talvez a Democracia – no famoso aforismo – seja mesmo aquele sistema onde ninguém é governado melhor ou pior do que merece. 

 

9.

Numa época em que parecem não restar dúvidas sobre o poder mediático, é curioso que as televisões – com suas extensões digitais – continuem a fazer de conta que apenas escrutinam o poder, quando são poderosos centros de poder político e económico. Seja esse poder exercido de forma consciente (como resulta da já clássica visão do grande conspirador capitalista proprietário de Indústrias Mediáticas) ou de forma ingénua (admitindo comentadores, segundo a lógica do martelo, mas cujo potencial político se multiplica por mil a cada minuto de exposição em horário nobre). Nós, pobres leitores, laboramos em modo analógico, segundo valores criados numa civilização do papel, quando já muito pouco resta desse mundo, pelo menos do ponto de vista da influência social do escritor. Por outro lado, continuamos a fingir espanto quando os políticos mentem, quando todos os dias mentem os médicos, treinadores, empresários, alguns jornalistas, os publicitários, os cardeais e os cantores, e por vezes até os prémios literários e artísticos nos mentem com todos os dentes. Se quisermos ir mais fundo podemos até dizer: quem não mente talvez não seja filho de boa gente. 

No mundo antigo, a proibição da calúnia podia servir os interesses do povo, pois a eloquência dos poderosos (os mais educados e treinados para falar em público) servia de instrumento para controlar a multidão. Por isso, o caráter antidemocrático do direito romano foi sendo controlado com o alargamento da liberdade de expressão. A divulgação dos debates do Senado – um tópico central e crítico da triste história do parlamentarismo português – provocou em Roma «o desenvolvimento do poder dos tribunos e mais tarde assumiu a forma de uma espécie de jornalismo», embora um jornalismo que nunca se tornou um instrumento poderoso de expressão da opinião pública. 

A ascensão dos grandes meios de comunicação tem sido desde os anos 20 do século XX um festival de problemas e tiranias, mas a figura romântica do jornalista tende a abafar o debate sobre o contexto económico e cultural, de onde decorre o que entendemos por jornalismo. Se o problema do jornalismo fosse apenas o da verdade, a Universidade, em princípio, podia chamar a si a tarefa, com melhores resultados. Mas a simplificação da realidade (política ou outra) num discurso «jornalístico» é desde logo um problema de enorme complexidade. Quem define o nível de simplificação? O mercado? O editor chefe, sujeito ao desempenho comercial da empresa? O diretor de informação nomeado politicamente? Não são problemas fáceis e quem achar que isto se resolve com melhor jornalismo ou profissionais competentes, ainda não pensou durante mais de cinco segundos sobre o que pretende dizer com «melhor jornalismo ou profissionais competentes». As alterações vertiginosas na escala do público (com a massiva alfabetização das populações) e no tipo de plataformas utilizadas (com as mudanças tecnológicas introduzidas pela eletrónica) estão a redefinir o discurso jornalístico, a sua propriedade e financiamento. Com o espantoso recuo das vendas de jornais em papel, por certo não seria de esperar a continuidade eterna do jornalista. O problema é que a mutação tecnológica trouxe mudanças inesperadas. As competências e características necessárias para falar diante de uma câmara são muito diversas das competências exigidas para se escrever um bom texto jornalístico. Do mesmo modo, o tempo disponível para o discurso jornalístico está em recuo, o que obriga o jornalismo a convocar todas as técnicas circenses ao seu alcance. 

Os novos marxistas tendem a destacar as relações entre grandes movimentos de capitais, aquisição de aparelhos ideológicos e a captura do Estado. Sou menos esquemático, não julgo antecipadamente as intenções de jornalistas ou políticos, nem sequer dos grandes proprietários de Jornais e Televisões de grande escala, embora neste último caso seja necessária uma grande dose de fé na Humanidade. Parece-me que o problema é mais bicudo, por resultar daquilo a que os velhos marxistas chamavam as contradições do sistema, que nunca são o resultado de meras forças decorrentes do capital ou da fetichização da mercadoria, mas incluem limites muito concretos sobre a capacidade dos humanos em identificarem todas as variáveis causadas pelas suas ações. Contradições entre o dever de informar com rigor, por exemplo, e a necessidade de ser ouvido num ecossistema, onde o prémio para a declaração mais estúpida e insólita é cada vez mais elevado. Entre a complexidade dos assuntos humanos e a falta de tempo para estudar. Entre a necessidade de ser equidistante e ser um comum mortal com preferências, ódios pessoais e ressentimentos.

É difícil não recordar o velho Cícero. Devido ao seu passado plebeu, fazia questão de difamar tudo aquilo que não apreciava. Piso, de quem se dizia ser galante e eloquente, embora a sua integridade fosse questionável, teve o bom senso de organizar uma conspiração contra Nero. Durante as lutas civis da República Romana, apareceu um livro dedicado a Piso, onde se lembrava que o soberano tinha o dever de equilibrar os conflitos e usar a moderação, pois em conflitos entre cidadãos da mesma República nem a vitória servia para aplacar os terríveis estragos causados pela fúria dos conflitos entre partidos. Talvez a cultura romana tenha deixado raízes mais fundas do que julgamos, pela ação quase milenar das suas duas filhas diletas: a Igreja e a Universidade. Desde há muito que os historiadores invocam sobretudo a esfera da autoridade (e menos a da liberdade) para explicar a liberdade de expressão do mundo romano. O direito à liberdade de expressão foi bem protegido em Roma, mas apenas para os governantes. Isto numa civilização onde a facilidade de gritar mentiras numa praça e a dificuldade de o governo fazer chegar a todas as casas a sua versão dos factos tornavam perigosa a liberdade de expressão. Curiosamente, após séculos de relativo controlo das diferentes formas de comunicação, as redes sociais voltam a lançar lama nas ruas embora, paradoxo dos paradoxos, seja nessa lama que medra a liberdade. O pior é que a liberdade é uma mulher de seios nus e muito enfurecida. Calma, camaradas. Não adianta invocar os fantasmas do patriarcado, as velhas fórmulas não funcionarão e temo que desta feita a festa seja de arromba. Veremos se não nos acaba com a saúde.

Como em tantas outras coisas, os escritores romanos parecem bem mais sofisticados do que os nossos especialistas contemporâneos. Tácito sintetizou bem a ambiguidade da relação entre informação e política: «a felicidade de uma época é sentir o que queremos e podermos dizer o que sentimos». Se o que sentimos está à partida condicionado por interesses editoriais nem sempre claros (seja por embirração pessoal ou ódio político) com enorme capacidade de impacto junto do público, e se estes interesses editoriais colocam à frente do escrutínio da verdade o escândalo judicial, o que fazer quando o próprio exercício da justiça estiver contaminado pela ideia de que os políticos são todos corruptos? Talvez as redes sociais não sejam o nosso único problema no equilíbrio entre liberdade de expressão e liberdade política. Deve o combate à corrupção arrasar os princípios básicos da liberdade democrática? Nada é mais relevante na história do Ocidente do que a noção de liberdade, esse profundo mistério histórico, mistura de filosofia grega e austeridade latina, inspirador de revoluções democráticas, conquistas de direitos e teorias científicas. Mas nada parece ser tão difícil de sustentar a longo prazo. Oxalá não morramos todos esmagados debaixo das pedras onde se gravou a liberdade da República.

Relacionados

Simpatia Inacabada #10
Filosofia e História
Alda Rodrigues

Simpatia Inacabada #10

APANHAR AMORAS #2   Tudo existe para se transformar em palavras? Nós próprios podemos ser só respiração que deseja transformar-se noutra coisa. Em vez de falarmos em voz alta, murmuramos, como a água a correr, os ramos das árvores ao vento, as abelhas e outros insectos. Música do sentido? No

Ler »
Dicas de beleza para futuros falecidos
Boa Vida
Rafaela Ferraz

Dicas de beleza para futuros falecidos

Há duas fases da vida em que se torna absolutamente essencial ter uma rotina de cuidados de pele: a vida propriamente dita, e depois a morte. Felizmente, a indústria da beleza fatura cerca de 98 mil milhões de dólares por ano nos EUA, a indústria funerária 23 mil milhões, e

Ler »
George Carlin e a Verdade na Comédia
Artes Performativas
Pedro Goulão

George Carlin e a Verdade na Comédia

“Dentro de cada cínico, existe um idealista desiludido” Quando comecei a escrever na Almanaque, o Vasco M. Barreto pediu-me que não escrevesse sobre o estafado tema dos limites do humor. Aceitei, mesmo tendo em conta que isso era um limite ao humor, pelo menos o meu, e que alguns números

Ler »