Boa Vida

Bretanha - Sozinhos em casa
Boa Vida
Helena Araújo

Bretanha – Sozinhos em casa

Onde estava no momento em que lhe anunciaram que ia viver várias semanas em confinamento? Eu estava num lar de estudantes em Brest, a fazer as malas para mudar para um alojamento local onde ficaríamos alguns dias, enquanto esperávamos a data de entrar no apartamento que arrendámos. O telefone tocou. Era o Joachim, a dizer que “fontes próximas do Eliseu” o tinham informado de que o Macron ia fazer um discurso na televisão, para anunciar

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A varanda da Maianga
Boa Vida
Marta Lança

A varanda da Maianga

1. “Sete e Meio”, assim ficou conhecido o apartamento na Maianga, em Luanda onde, entre 2005 e 2007, morei com artistas angolanos, Orlando, Kiluanji, Ihosvanny, Yonamine, Francisca e o bebé Njamy, os mais perenes, outros em temporadas de média duração[1]. Ficava num sétimo andar (e meio), num prédio de arquitetura moderna, semelhante aos edifícios da Avenida Estados Unidos da América, em Lisboa, mas degradado pela passagem do tempo e negligente manutenção. Bem localizado, dali podíamos

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Envelhecer nas bancadas
Boa Vida
Bruno Sena Martins

Envelhecer nas bancadas

Aceitar sem mais a idade que nos é ditada no registo civil implica uma cobarde cedência aos poderes instituídos. Entre os muitos poderes que nos clamam à capitulação, devemos apontar o dedo à burocracia estatal, a uma noção moderna de tempo linear e, claro, à pressão para festejar aniversários. A ideia de que os aniversários devem ser festejados mais não é do que uma bizarria que nos obriga a declarar publicamente a idade como, ainda,

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Bretanha – Casa com vista sobre a cidade
Boa Vida
Helena Araújo

Bretanha – Casa com vista sobre a cidade

Quando vim morar para a Alemanha, em 1989, descobri que deixei parte de mim em Portugal. Sosseguem, não comecem já a revirar os olhos, que isto não é um fadinho e não vou choramingar que “quando parti, meu coração ficou, aaaiiiii…”. Porque não foi o coração – foram os hábitos. Tive essa revelação numa das primeiras manhãs da minha vida nova, quando entrei num autocarro praticamente vazio e me perguntei se devia cumprimentar o motorista,

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Aprendo depressa a chamar-te de realidade. Carta de São Paulo
Boa Vida
Marta Lança

Aprendo depressa a chamar-te de realidade. Carta de São Paulo

Em 2017 passei uma temporada em São Paulo, 20 anos após ter vivido em Paris, um ano e pouco antes do desastre Bolsonaro, entre o impeachment da Dilma e o golpe baixo do Lula preso. Escrevia-se e gritava-se muito “Fora Temer”, o ambiente era politicamente sinistro, não imaginava que podia piorar tanto.  1. Troca de casas entre amigas, apartamento em espelho Penha de França vs. Santa Cecília, com quarto e brinquedos para criança e livros

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Le Piano Vache
Boa Vida
Marta Lança

Le Piano Vache

1. Percorri o solo europeu sobre os carris do interrail, ainda a Chéquia se chamava Checoslováquia. E em 1997, saí do ninho lisboeta para o Erasmus em Paris. Quem podia — a bolsa mal chegava para pagar a renda — erasmava, era parte do ritual de iniciação “devir europeu”. Ter 21 anos em Paris foi um embate de geopolítica existencial, um momento fundador no património de mundividência e ceticismo. Apresentou-me a ambivalente digestão de uma

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As Quatro Virtudes do Budismo Brasileiro<sup>[1]</sup>
Boa Vida
Manuel Arriaga

As Quatro Virtudes do Budismo Brasileiro[1]

Uma breve exploração dos preconceitos na minha busca de alguma forma de espiritualidade 1. JoutJout Prazer. É esse o nome do canal Youtube de Julia Tolezano da Veiga Faria, a conhecida vlogger que me levou ao budismo brasileiro. Tudo começou quando uma amiga me sugeriu um vídeo em que Jout Jout (como é conhecida) lia um livro ilustrado. Sugado pelo vórtice do mecanismo de recomendações do YouTube, em breve dei por mim a assistir a

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Bretanha – Concarneau, ou: Disfunção Cognitiva
Boa Vida
Helena Araújo

Bretanha – Concarneau, ou: Disfunção Cognitiva

Quem seria capaz de ter a estranha ideia de se ir alojar, depois de velho, num lar de estudantes? Nós. Enfim, nem tão velhos como isso, mas já com idade para ter juízo. No entanto, instalámo-nos num lar de estudantes que tinha o charme dos anos sessenta, vista para o parque de estacionamento e para a faculdade de Direito, Economia e Gestão de Brest, para os estudantes que passavam –  quase sempre debaixo de bátegas

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Bretanha, Le Conquet
Boa Vida
Helena Araújo

Bretanha, Le Conquet

No dia 2 de Março de 2020, quinze dias antes do discurso de Macron que fecharia a França, saímos a meio da tarde para Le Conquet. No caminho para essa pequena cidade costeira passámos junto a um bunker marítimo de tamanho desmedido. Herança da ocupação alemã, era o primeiro de muitos bunkers que viríamos a encontrar em quase todas as praias da Bretanha. E eu, que nem sequer tenho nada a ver com essa História,

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Regresso à Bretanha
Boa Vida
Helena Araújo

Regresso à Bretanha

Ultimamente dou comigo a sentir uma saudade física da Bretanha. Dentro de mim algo se inquieta e foca numa imagem concreta, e de repente vejo-me nas escadas do meu prédio, ou na rue de Pontaniou em frente à casa cujo intercomunicador avariado cumprimentava todos os passantes, ou a entrar no supermercado. Não são as praias belíssimas, as ilhas e o perfil doce das rochas, o marisco, os enclos, os menires. Nestas pontes involuntárias para os

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Bretanha - Sozinhos em casa

Bretanha – Sozinhos em casa

Onde estava no momento em que lhe anunciaram que ia viver várias semanas em confinamento? Eu estava num lar de estudantes em Brest, a fazer as malas para mudar para um alojamento local onde ficaríamos alguns dias, enquanto esperávamos a data de entrar no apartamento que arrendámos. O telefone tocou.

A varanda da Maianga

A varanda da Maianga

1. “Sete e Meio”, assim ficou conhecido o apartamento na Maianga, em Luanda onde, entre 2005 e 2007, morei com artistas angolanos, Orlando, Kiluanji, Ihosvanny, Yonamine, Francisca e o bebé Njamy, os mais perenes, outros em temporadas de média duração[1]. Ficava num sétimo andar (e meio), num prédio de arquitetura

Envelhecer nas bancadas

Envelhecer nas bancadas

Aceitar sem mais a idade que nos é ditada no registo civil implica uma cobarde cedência aos poderes instituídos. Entre os muitos poderes que nos clamam à capitulação, devemos apontar o dedo à burocracia estatal, a uma noção moderna de tempo linear e, claro, à pressão para festejar aniversários. A

Bretanha – Casa com vista sobre a cidade

Bretanha – Casa com vista sobre a cidade

Quando vim morar para a Alemanha, em 1989, descobri que deixei parte de mim em Portugal. Sosseguem, não comecem já a revirar os olhos, que isto não é um fadinho e não vou choramingar que “quando parti, meu coração ficou, aaaiiiii…”. Porque não foi o coração – foram os hábitos.

Aprendo depressa a chamar-te de realidade. Carta de São Paulo

Aprendo depressa a chamar-te de realidade. Carta de São Paulo

Em 2017 passei uma temporada em São Paulo, 20 anos após ter vivido em Paris, um ano e pouco antes do desastre Bolsonaro, entre o impeachment da Dilma e o golpe baixo do Lula preso. Escrevia-se e gritava-se muito “Fora Temer”, o ambiente era politicamente sinistro, não imaginava que podia

Le Piano Vache

Le Piano Vache

1. Percorri o solo europeu sobre os carris do interrail, ainda a Chéquia se chamava Checoslováquia. E em 1997, saí do ninho lisboeta para o Erasmus em Paris. Quem podia — a bolsa mal chegava para pagar a renda — erasmava, era parte do ritual de iniciação “devir europeu”. Ter

As Quatro Virtudes do Budismo Brasileiro<sup>[1]</sup>

As Quatro Virtudes do Budismo Brasileiro[1]

Uma breve exploração dos preconceitos na minha busca de alguma forma de espiritualidade 1. JoutJout Prazer. É esse o nome do canal Youtube de Julia Tolezano da Veiga Faria, a conhecida vlogger que me levou ao budismo brasileiro. Tudo começou quando uma amiga me sugeriu um vídeo em que Jout

Bretanha – Concarneau, ou: Disfunção Cognitiva

Bretanha – Concarneau, ou: Disfunção Cognitiva

Quem seria capaz de ter a estranha ideia de se ir alojar, depois de velho, num lar de estudantes? Nós. Enfim, nem tão velhos como isso, mas já com idade para ter juízo. No entanto, instalámo-nos num lar de estudantes que tinha o charme dos anos sessenta, vista para o

Bretanha, Le Conquet

Bretanha, Le Conquet

No dia 2 de Março de 2020, quinze dias antes do discurso de Macron que fecharia a França, saímos a meio da tarde para Le Conquet. No caminho para essa pequena cidade costeira passámos junto a um bunker marítimo de tamanho desmedido. Herança da ocupação alemã, era o primeiro de

Regresso à Bretanha

Regresso à Bretanha

Ultimamente dou comigo a sentir uma saudade física da Bretanha. Dentro de mim algo se inquieta e foca numa imagem concreta, e de repente vejo-me nas escadas do meu prédio, ou na rue de Pontaniou em frente à casa cujo intercomunicador avariado cumprimentava todos os passantes, ou a entrar no