No conto «Across a Crowded Room», publicado na The New Yorker em 1979, Barbara Pym constrói uma história sobre uma mulher com cerca de sessenta anos que acompanha um amigo a um jantar formal num colégio de Oxford. A protagonista, apesar de se ter graduado naquela universidade, nunca dera aulas ali («a vida tinha-a levado noutra direcção») e sente-se por isso fora do seu meio. A estrutura do conto segue o plano rígido do jantar de gala: entrada, sopa, prato de peixe, prato de carne, sobremesa e digestivos. A própria disposição dos convidados está definida à partida, pelo que o amigo da protagonista, George, pode oferecer-lhe algumas informações sobre as pessoas que se sentarão ao seu lado e com quem terá de fazer conversa.
Na primeira parte do jantar, a protagonista fica sentada entre George e um professor visitante americano, Ned. Na conversa com o professor americano, percebe que ambos têm uma ligação à literatura inglesa e que Ned estuda Keats, o que a leva a tentar lembrar-se do que aprendera sobre o poeta: partes de poemas famosos vêm-lhe à memória, alguns títulos que a confundem, algo sobre uma pomba, mas nada que possa usar para fazer conversa. Recorda-se, contudo, de ter visitado a casa de Keats, e a conversa entre ambos prossegue sobre esse tópico, extinguindo-se rapidamente com uma referência ao verso famoso de Eliot sobre a crueldade do mês de Abril.
A protagonista, acabada a conversa, concentra-se nos pratos que lhe são apresentados. O prato de carne, veado, lembra-a de um poema de Wordsworth, «uma consequência de se estudar Literatura Inglesa», o que a leva a trocar mais algumas palavras com o seu companheiro de mesa americano. Depressa se vê novamente «abandonada», e, sem ninguém com quem conversar, dedica-se a observar o espaço e as pessoas ali reunidas. Um homem de cabelo grisalho chama-lhe a atenção, pois parece ser alguém com quem privou no passado, Gervase Harding. Lembra-se de terem mantido uma relação amorosa nos tempos em que eram estudantes, sendo ele casado, mas depois tinham perdido o contacto. No esforço que faz para se lembrar de Gervase, ocorre-lhe uma canção que podia explicar a sua situação, uma canção antiga sobre duas pessoas que se encontram numa divisão apinhada de gente («Some Enchanted Evening», Rodgers e Hammerstein); mas essa canção, sendo sobre duas pessoas que se vêem pela primeira vez, dificilmente se adequaria a pessoas que se reencontram ao fim de quarenta anos. Nesse momento, Ned pergunta-lhe porque sorri e a protagonista explica-lhe que viu alguém que conhecia, mas que o seu cabelo louro estava agora branco. Ned cita-lhe então um verso de Peele, um «isabelino menor», sobre o cabelo que muda de cor: «His golden locks Time hath to silver turn’d». Menciona ainda outro verso do poema e pergunta-lhe se se adequa à situação: ela responde que não sabe, visto não ter acompanhado a carreira de Gervase.
O jantar é interrompido e os convidados abandonam a sala onde jantavam para que as mesas possam ser preparadas para a segunda parte da refeição. Ao observar algumas pessoas a caminharem nos jardins, lembra-se de outra canção e partilha um dos versos com o pároco que se encontra ao seu lado naquele momento: «All in the April evening» (Hugh Roberton). Sem a música, o verso da canção soa como qualquer verso de um poema e o pároco observa-a como se fosse louca: certamente que «mulheres idosas a citar poesia eram de evitar, uma coisa de se fugir».
Para a segunda parte do jantar, fica sentada entre um «jovem que estuda computadores» — poucas oportunidades de conversa surgiriam dali — e o reitor, com quem fala sobre a floresta perto da qual vive. O reitor lembra-se da floresta, e isso introduz na narrativa uma referência a versos de «The Solitary Reaper». Olhando à sua volta, percebe que está mais perto de Gervase e que, tal como ela, ele tinha escolhido beber um Porto e comer uma rodela de ananás: «as grandes mentes pensam de forma semelhante». Tenta lembrar-se do nome da mulher de Gervase, que segundo se recorda começava por «M», mas o esforço não lhe devolve nada.
Terminado o jantar, o grupo reúne-se para os digestivos e a protagonista tem finalmente oportunidade de falar com Gervase. Ele não tem memória dela, mas ela ajuda-o com pormenores sobre o passado de ambos e finalmente recorda-se de aulas que tiveram juntos. Gervase cita o mesmo verso do poema de Peele, que teriam estudado como colegas, «como se o estivesse a aplicar a ela», precisamente como ela fizera anteriormente em relação a ele. Quando ela lhe pergunta o nome da mulher, ele olha-a surpreendido e diz que nunca foi casado. Esta informação deixa-a perplexa. O facto de a sua memória da relação com Gervase ter estado errada durante tantos anos põe em causa toda a sua vida; de repente, a canção de Rodgers e Hammerstein passa a fazer sentido no contexto desta história, o que motiva o título do conto: dois estranhos encontram-se numa divisão apinhada de gente (embora a ironia escape à protagonista, não deve ser ignorada pelo leitor). A narração retoma depois a imagem da canção de Roberton para descrever alguns grupos de pessoas a passear-se pelos jardins: entre as duas referências ao mês de Abril, a preterida é a de Eliot (que provavelmente seria adequada, tendo em conta a situação da protagonista).
A forma como poemas e canções se conjugam neste conto sugere não haver distinções entre as duas formas; mas também é interessante olhar para a relevância que as canções (e um poeta menor) assumem por comparação com os nomes dos grandes poetas a que se faz alusão: o peso histórico atribuído a certos autores dissipa-se e são as canções (e o poeta menor) que acabam por ser mais úteis para enquadrar os vários momentos por que passa a protagonista, mesmo quando são inadequados. Isto não significa que canções e poemas menores sejam preferíveis; tal como poemas maiores, não nos tornam melhores pessoas, mais sensíveis ou inteligentes, simplesmente fazem parte da maneira como vivemos e lembram-nos, por isso, pessoas, sítios e acontecimentos. Requerem, no entanto, a reciprocidade de alguém que os compreenda como significativos: é por isso que para certas pessoas, apesar de todas as conversas goradas, a única coincidência infeliz é descobrir que vão passar uma refeição sentadas ao lado de um «estudante de computadores».