Literatura

Quem?
Literatura
Ana Isabel Soares

Quem?

Não é que esteja a esquivar-me ao assunto. Ou a tentar formar frases para que se ajustem a um tema. A verdade é que, as mais das vezes, não me recordo do que eu própria escrevi, quanto mais do que li – quanto mais, então, do que pensei escrever ou estive à beira de escrever. Patrick Süskind ganhou fama com O Perfume, o seu terceiro livro (entre nós, há uma edição da Editorial Presença, traduzida

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Não consigo dormir com o barulho dos indianos a reencarnar
Literatura
Afonso de Melo

Não consigo dormir com o barulho dos indianos a reencarnar

Na Índia há milhões e milhões de pessoas. Certas enciclopédias dizem que são 900 milhões de pessoas. Alguns atlas referem mil e trezentos milhões. Vê-se bem que nem as enciclopédias nem os atlas foram alguma vez à Índia. Na Índia há milhões e milhões e milhões e milhões e milhões de milhões de pessoas. Sei muito bem do que estou a falar: já fui muitas e muitas vezes à Índia. Talvez não um milhão de

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Da série personagens do meu país (4): Hércules Dias
Literatura
Filipe Nunes Vicente

Da série personagens do meu país (4): Hércules Dias

Deixou uma marca indelével na política e no jornalismo português. Amigo do seu amigo, defensor das populações com dificuldades, suportou, no entanto, uma campanha de ódio e maledicência como poucos. Multifacetado, foi autarca, deputado, jornalista e escritor. Na sua morte, em 2004, dele disse Almeida Santos: Não morreu um homem, nasceu uma herança de probidade, cultura e dedicação. Hércules Dias nasceu na Guarda, em 1930, num ambiente politizado e intelectual. O pai, licenciado em Química, foi

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Da série personagens do meu país (4): Conceição Carvalho do Ó.
Literatura
Filipe Nunes Vicente

Da série personagens do meu país (4): Conceição Carvalho do Ó.

Advogada lançada nas tarefas ministeriais, benfeitora, mulher de armas, de origem humilde, mas com transcurso brilhante. Ganhou o respeito dos seus concidadãos pela forma abnegada como se empenhou na vida pública e pelo modo recatado como dela se soube retirar. Nasceu em 1950, na Boavista, um pequeno lugar do distrito de Leiria, e cresceu com broa e carapaus secos da Nazaré, que dividia com as quatro irmãs. Diz por isso que aprecia hoje mais os

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Novas do paraíso
Literatura
Álvaro Domingues

Novas do paraíso

Besta de carga é o que mais ouço. Nota-se nesta curvatura do corpo, agora que me vejo caminhando descompassado e um tanto incerto. Já quase me esquecera do tempo ruim que trago inscrito em quase tudo que ainda penso; por isso estas costelas salientes, o pêlo que perdeu o brilho e a cabeça quase sempre baixa. Enfim. De pouco valem lamentações que ninguém ouve e o mundo muda mais rapidamente que o rodopio diário do

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Weimar # 10
Literatura
José Gardeazabal

Weimar # 10

RITUAL – ESFERA – RABOS – UM POR CENTO – BOA NOVA   RITUAL A verdade, em democracia, incluirá um ritual, um reality show, dos verdadeiros, claro. Governante que tenha o azar de ser criticado duas semanas seguidas irá à televisão vestido de roupa importada, mas sustentável. No primeiro dia, jurará que nada sabia. No segundo, dirá que não se lembrava de que sabia, e no terceiro dia será demitido e pedirá desculpa na televisão,

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Simpatia Inacabada #7
Cinema e Audiovisual
Alda Rodrigues

Simpatia Inacabada #7

Patricia Highsmith Na secção literária do The New York Times, procuro sempre a rubrica “By the Book”, um inquérito sobre leituras de escritores ou pessoas ligadas aos livros. Leio em busca de histórias engraçadas ou referências a autores interessantes que ainda não conheça, mas, entre as perguntas recorrentes, há uma que me dá sempre que pensar: “Um grande livro pode estar mal escrito? Que outros critérios são mais importantes?” Proust escreve bem? Se calhar, a

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Pequenas doses de literatura
Literatura
Joana Sá

Pequenas doses de literatura

Dificilmente se sente mais a falta de tempo para ler do que em Maio, quando começa a Feira do Livro de Lisboa (e me lembro que na altura em que frequentava a Feira do Livro do Porto, a dificuldade era conseguir fazer as compras durarem mais de um mês…). Mas, na verdade, não é necessariamente uma questão de falta de tempo –- é mais uma questão de falta de tempo garantido, ou seja, de tempo

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Pim, pam, pum
Literatura
Filipa Melo

Pim, pam, pum

Ao Afonso Praça e ao Fernando Assis Pacheco  Quando se mata, morre-se? Não. Renasce-se. Porque, na verdade, não fui eu quem morreu  há pouco, quando senti o primeiro coice a atingir-me no ombro. O dedo não parou de dar ao  gatilho, duas, três, mais vezes. Os olhos não pararam de ver enquanto os corpos se erguiam  ou tombavam por entre a névoa. Os ouvidos não pararam de ouvir.  Já tinha escurecido e estava a ficar

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Asininoceno
Literatura
Álvaro Domingues

Asininoceno

– Dizem que o Antropoceno, a idade geológica em que vivemos, é uma engrenagem do tamanho do mundo que funciona ao ritmo do mais desenfreado capitalismo, o mais irresponsável e autodestrutivo, o mais rapina. – Vives nesse terror, primo. Esse Antropoceno é pior que moscas nojentas a entrarem-nos pelos olhos…, mas eu tinha uma vaga ideia de que isso das idades geológicas era apenas assunto de estratigrafia, geologia, vulcões, climatologia e parque jurássico. Pelos vistos

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Quem?

Quem?

Não é que esteja a esquivar-me ao assunto. Ou a tentar formar frases para que se ajustem a um tema. A verdade é que, as mais das vezes, não me recordo do que eu própria escrevi, quanto mais do que li – quanto mais, então, do que pensei escrever ou

Não consigo dormir com o barulho dos indianos a reencarnar

Não consigo dormir com o barulho dos indianos a reencarnar

Na Índia há milhões e milhões de pessoas. Certas enciclopédias dizem que são 900 milhões de pessoas. Alguns atlas referem mil e trezentos milhões. Vê-se bem que nem as enciclopédias nem os atlas foram alguma vez à Índia. Na Índia há milhões e milhões e milhões e milhões e milhões

Da série personagens do meu país (4): Hércules Dias

Da série personagens do meu país (4): Hércules Dias

Deixou uma marca indelével na política e no jornalismo português. Amigo do seu amigo, defensor das populações com dificuldades, suportou, no entanto, uma campanha de ódio e maledicência como poucos. Multifacetado, foi autarca, deputado, jornalista e escritor. Na sua morte, em 2004, dele disse Almeida Santos: Não morreu um homem, nasceu

Da série personagens do meu país (4): Conceição Carvalho do Ó.

Da série personagens do meu país (4): Conceição Carvalho do Ó.

Advogada lançada nas tarefas ministeriais, benfeitora, mulher de armas, de origem humilde, mas com transcurso brilhante. Ganhou o respeito dos seus concidadãos pela forma abnegada como se empenhou na vida pública e pelo modo recatado como dela se soube retirar. Nasceu em 1950, na Boavista, um pequeno lugar do distrito

Novas do paraíso

Novas do paraíso

Besta de carga é o que mais ouço. Nota-se nesta curvatura do corpo, agora que me vejo caminhando descompassado e um tanto incerto. Já quase me esquecera do tempo ruim que trago inscrito em quase tudo que ainda penso; por isso estas costelas salientes, o pêlo que perdeu o brilho

Weimar # 10

Weimar # 10

RITUAL – ESFERA – RABOS – UM POR CENTO – BOA NOVA   RITUAL A verdade, em democracia, incluirá um ritual, um reality show, dos verdadeiros, claro. Governante que tenha o azar de ser criticado duas semanas seguidas irá à televisão vestido de roupa importada, mas sustentável. No primeiro dia,

Simpatia Inacabada #7

Simpatia Inacabada #7

Patricia Highsmith Na secção literária do The New York Times, procuro sempre a rubrica “By the Book”, um inquérito sobre leituras de escritores ou pessoas ligadas aos livros. Leio em busca de histórias engraçadas ou referências a autores interessantes que ainda não conheça, mas, entre as perguntas recorrentes, há uma

Pequenas doses de literatura

Pequenas doses de literatura

Dificilmente se sente mais a falta de tempo para ler do que em Maio, quando começa a Feira do Livro de Lisboa (e me lembro que na altura em que frequentava a Feira do Livro do Porto, a dificuldade era conseguir fazer as compras durarem mais de um mês…). Mas,

Pim, pam, pum

Pim, pam, pum

Ao Afonso Praça e ao Fernando Assis Pacheco  Quando se mata, morre-se? Não. Renasce-se. Porque, na verdade, não fui eu quem morreu  há pouco, quando senti o primeiro coice a atingir-me no ombro. O dedo não parou de dar ao  gatilho, duas, três, mais vezes. Os olhos não pararam de

Asininoceno

Asininoceno

– Dizem que o Antropoceno, a idade geológica em que vivemos, é uma engrenagem do tamanho do mundo que funciona ao ritmo do mais desenfreado capitalismo, o mais irresponsável e autodestrutivo, o mais rapina. – Vives nesse terror, primo. Esse Antropoceno é pior que moscas nojentas a entrarem-nos pelos olhos…,